As unidades do Procon do Grande ABC somaram 40.410 atendimentos ao longo do ano de 2017. Apesar de chegar à expressiva média de 110 queixas por dia, o número é 41,57% menor do que o registrado em 2016. Para especialistas, diversos fatores podem ter impactado na redução, entre eles a crise econômica, que segurou os gastos, e a mudança do perfil do consumidor, que busca soluções para os problemas na internet. Ou seja, não necessariamente houve melhora na qualidade dos produtos e serviços prestados.
Os dados anuais dos serviços de atendimento ao consumidor são disponibilizados pelo Sindec (Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor), do Ministério da Justiça. É importante destacar que o registro pode apresentar dados diferentes em relação aos daqueles mantidos pelos postos de atendimento ao consumidor municipais devido à contabilização de diferentes atendimentos relacionados ao mesmo caso.
Para a professora da Faculdade de Direito de São Bernardo Bianca Richter, a redução dos números regionais pode ser resultado de um cenário que configura melhora no atendimento das empresas e também impacto da redução do consumo. “Por conta de ações com maiores condenações, principalmente em valores, algumas empresas têm tomado medidas internas para reduzir os danos ao caixa e ao consumidor. Outra questão que pode influenciar é que, por conta da crise, pode ser que tenhamos menos consumidores, o que é uma realidade. As pessoas estão mais voltadas aos bens primários de consumo e deixam de comprar outros produtos, de maior valor, por exemplo”, explicou.
Além disso, a popularização de plataformas disponíveis na internet, como o Reclame Aqui e as próprias páginas das empresas no Facebook, que acabam sendo utilizadas como canal de reclamação direto do usuário, também podem ter influenciado nessa redução do volume de queixas. “Para registrar reclamação no Procon, é preciso ir pessoalmente. Então, talvez o consumidor veja mais eficiência em canais on-line, onde há menos perda de tempo até por conta da correria”, opinou a advogada especialista em Direito do Consumidor, Ana Paula Satcheki.
NA PRÁTICA
Mesmo com essa migração de canais, o Procon ainda tem destaque na resolução dos casos. Segundo informações do Procon Santo André, o índice de solução nos atendimentos é de, aproximadamente, 80% nos preliminares – que contempla orientação, contato telefônico com fornecedor, envio de carta – e de cerca de 50% nos casos que foram para audiências de conciliação. Em São Caetano, o índice geral de casos resolvidos é estimado em cerca de 70%. O mais alto está em Ribeirão Pires, com índice que chega a 85%.
“São poucos os casos em que a empresa acredita que tem direito de recorrer. Mas só vai para o judiciário quando a gente esgota o máximo da nossa atuação”, destacou o diretor do Procon São Caetano, Marco Aurélio Sanches.
O prazo legal dado aos Procons para solucionarem os problemas é de 120 dias. Conforme explica a diretora da unidade de Santo André Doroti Gomes Cavalini, a tendência é que a resolução aconteça ainda antes deste período, na média de 80 dias. “Quando o consumidor vem até aqui, fazemos um contato e chamamos a empresa para tentativa de conciliação. Ele é contatado por telefone e carta, e a resposta tem prazo de 30 dias para retorno. Após a resposta, há uma análise e marcamos a audiência se necessário.”
Bianca também destacou a rapidez do serviço, principalmente se for comparado com a entrada direta de ação na Justiça. “É importante meio para evitar a judicialização. Temos plataformas não judiciais, o Reclame Aqui ajuda bastante, então as empresas têm se prevenido. Muitas vezes, na Justiça pode se levar até dez anos para solucionar um caso.”
As demais cidades não retornaram aos questionamentos do Diário até o fechamento desta edição.
Telefone e TV à cabo representam 26% das reclamações
Os líderes do ranking de reclamações das unidades dos Procons do Grande ABC são os serviços de telefonia e TV por assinatura. De acordo com dados disponibilizados pelo Sindec (Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor), do Ministério da Justiça, as sete unidades dos serviços municipais registraram 4.668 reclamações a respeito da qualidade dos serviços disponibilizados para celulares, que representam 11,66% do total – veja mais informações na arte acima.Junto às queixas relacionadas à telefonia fixa (3.537) e TV por assinatura (2.388), os segmentos totalizam 10.593 reclamações, ou seja, representam 26,47% de todo o montante.
A popularização desses serviços nos últimos anos, atualmente presentes em grande parte das residências, pode ter influenciado nesta questão. “Todo mundo tem acesso a eles, que hoje são ofertados, inclusive, por preços menores. Além disso, o contrato de adesão geralmente é padrão e engloba os três serviços (TV por assinatura, internet e telefone). Então, ainda que a crise tenha complicado a vida do consumidor, trata-se de serviço que ele acaba mantendo, porque hoje já não tem como cortar, por conta desta dependência da internet”, analisou a professora da Faculdade de Direito São Bernardo, Bianca Richter.
Dividindo espaço no ranking, estão os serviços bancários, com o cartão de crédito, que ocupa a terceira posição, com 3.053 queixas, e os bancos, na sequência, com 2.146 registros. “Antes, os mais reclamados eram os bancos, que passaram a ter mais eficiência nos canais com os consumidores, o que diminuiu o volume de registros nos Procons. Hoje, há mais segurança no uso das transações, por conta da tecnologia, que possibilita cobranças automáticas. Então, facilitou muito, porque antes havia muitas reclamações de filas e atendimento, por exemplo”, explicou a advogada especialista em Direito do Consumidor, Ana Paula Satcheki.
De acordo com a diretora do Procon de Santo André, Doroti Gomes Cavalini, as mudanças nas regras do rotativo, estabelecidas pelo Banco Central no ano passado ainda são alvos de dúvidas. “A lei fala que se o pagamento da fatura não for integral, na próxima ela já vem parcelada. Isso até hoje gera reclamações sobre se é uma questão do banco”, disse.
Já em relação ao tipo de problema mais reclamado, a cobrança indevida é unânime, com 13.036 registros (32,58% do total). “O mais importante é que, uma vez identificada a cobrança indevida, que seja solucionado o quanto antes. Quanto mais mecânicas forem as transações, o que acontece hoje, há mais chances de haver equívocos. Por isso, mesmo que seja um valor pequeno, o consumidor deve procurar os seus direitos”, aconselhou Ana Paula.